Confesso que tinha um “irc”, acompanhado de bocejos, quando o assunto se tratava de filmes antigos e foi Crepúsculo dos Deuses o responsável de não só acabar com esse preconceito meu, como me instigar a procurar mais pérolas entre os considerados clássicos do cinema. Uma característica que os (bons) filmes mais datados possuem é a de se apoiar com força em um roteiro bem estruturado e atuações marcantes, não dependendo de efeitos digitais de ultima geração ou atores que só figuram na tela por venderem mais notícias aos tablóides. E este filme exemplifica tudo isso com louvor, a trama do roteirista que se envolve com uma decadente atriz do cinema mudo com o objetivo de deslanchar sua carreira, mas que acaba se vendo aprisionado no ego de uma diva surtada é muito bem engenhado e cada cena tem importância no desenvolvimento da trama, não ficando nada solto para trás. A atuação de Gloria Swanson é espetacular, e a atriz, que possui algumas características em comum com a própria personagem, rouba cada cena em que aparece, criando situações que variam do deslumbre a pena, criando uma Norma Desmond cheia de si e sem nenhuma noção da realidade que a cerca. O jogo de interesses e a sensação de desastre iminente acompanham o filme inteiro e faz de Crepúsculo dos Deuses um retrato do mundo do cinema que permanece relevante até os dias de hoje.
2 – A Malvada (1950, Dir: Joseph L. Mankiewicz)
A Malvada possui várias semelhanças com Crepúsculo dos Deuses, também se passa no mundo das estrelas, são do mesmo ano, levou o Oscar a que o outro estava concorrendo e possui uma outra atriz foda: Bette Davis. Mas ao contrário do filme anterior em que os personagens se perdem dentro de suas ilusões, os personagens deste filme estão muito cientes do que desejam e dispostos a tudo para alcançarem seus objetivos. A Malvada do título pode-se referir tanto a Eve, aspirante a atriz que se infiltra entre os poderosos da área para alcançar o estrelato como para Margo Channing, atriz veterana e admirada que trata a todos com completo desdém, sem se importar se está sendo grossa ou ferindo os sentimentos dos outros. Eu, particularmente, tenho uma fraqueza por personagens fortes e venenosas, e Bette Davis está incorporando tudo que eu mais gosto: ela pisa, cospe nos outros, destila veneno, toma seu dry-martini e sua redenção vem com o auto-conhecimento e não com uma mudança patética para uma versão mais boazinha e chatinha. Isso mesmo Bette Davis, continue humilhando todos os seres inferiores a sua volta que é o que você faz de melhor, e nós adoramos
3 – Manhattan (1979, Dir: Woody Allen)
Deixamos o mundo das estrelas para trás e vamos nos focar em nós: meros mortais. Woody Allen nesse filme trata dos relacionamentos nos tempos modernos, e mesmo com quase 30 anos continua completamente atual. Mostra pessoas que se cruzam e se perdem dentro das inúmeras opções que encontramos na grande cidade. Nós achamos alguém que nos faz bem, mas permanecemos com a dúvida de que se não existe alguém melhor solto por aí, alguém que não possua certos defeitos que nos irritam, mas que com certeza trará outros inúmeros obstáculos para atrapalhar a relação. Aliás, os obstáculos são os que mais aparecem no filme: incompatibilidade de idade, de opção sexual, de gosto cultural, paixões por namoradas de amigos, brigas com ex-namoradas. Afinal o namoro atualmente tem a função apenas de suprir nossos desejos afetivos e sexuais ou deve se aprofundar mais para uma compatibilidade entre almas, que pode ser alcançada com uma amizade, por exemplo? Essa é uma dúvida que Woody levanta, mas não responde, pois assim como nós ele não faz idéia da resposta (vamos combinar né gente? Quem acompanha sua vida pessoal sabe bem disso).O melhor é ir tentando até ficarmos em paz com nossos e seres amados e torcer para que nossos desejos não nos traia novamente.
4 – Asas do Desejo (1987, Dir: Win Wenders)
O preto e branco marca uma presença muito mais imortante neste filme: separa o mundo contemplativo e ideológico dos anjos com o mundo colorido e cheio de emoções e desejos dos mortais. É um filme puramente poético, daqueles que não se deve assistir apenas para entretê-lo durante 2 horas, e sim para pensar, vivenciar, tirar lição e admirar. É um filme com poucos diálogos e muitas idéias, os anjos circulam pelos humanos e vão trocando os pensamentos que escutam como quem troca as estações de rádio. A questão básica do filme, que é trocar a eternidade do mundo espiritual por uma existência mais curta e intensa abre margem para outros inúmeros questionamentos existências que não serão repetidos a exaustão, e cabe ao expectador abraça-los ao não. Fotografias e locações belíssimas completam o pacote para tornar esse filme uma experiência inesquecível tanto visualmente quanto intelectualmente.
5 – A Lista de Schindler (1993, Dir: Steven Spielberg)
O diretor-símbolo do cinema pipoca de grandes bilheterias e efeitos especiais fez desse trabalho sua obra mais intimista e sentimental. Aqui o objetivo não é te transportar para um mundo mágico e te fazer sonhar com todas as maravilhas que aparecem na tela. Esse filme quer te ferir, te fazer sangrar e eliminar suas esperanças de que vivemos em um planeta que possa chegar à perfeição. O tema da 2ª Guerra Mundial já foi abordado à exaustão em outros filmes, no colégio, livros, documentários da TV... Mas se sobrou alguma curiosidade com o tema e se você ainda não o viu, assista a esse filme sem receios. O diretor utiliza o preto e branco para poder utilizar de cenas da época, o que ajuda ainda mais a demolir a aura de obra ficcional do espetáculo. Todos sofrem, todos choram e se você não se comover em nenhuma cena durante o filme inteiro ligue já para um psiquiatra, pois algo não vai bem com suas sinapses nervosas. As atuações são contidas e passam longe do melodrama, em especial Ralph Fiennes encarna o perfeito “filho da puta”, daqueles que você tem vontade de cair na pancada se encontrar na rua. E não deixe de notar a única cena colorida do filme, de rasgar o coração
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